segunda-feira, 30 de junho de 2014

INSTANTES



"Se eu pudesse viver novamente a minha vida,
na próxima trataria de cometer mais erros.
Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais.
Seria mais tolo ainda do que tenho sido, na verdade
bem poucas coisas levaria a sério.
Seria menos higiênico, correria mais riscos, viajaria mais,
contemplaria mais entardeceres, subiria mais montanhas,
nadaria em mais rios.
Iria a mais lugares onde nunca fui, tomaria mais sorvete e menos lentilha,
teria mais problemas reais e menos problemas imaginários.
Eu fui uma dessas pessoas que viveram sensata e produtivamente
cada minuto da sua vida; claro que tive momentos de alegria.
Mas, se pudesse voltar a viver, trataria de ter somente bons momentos.
Porque se não sabem, disso é feito a vida, só de momentos.
Não percam o agora.
Se eu pudesse voltar a viver, começaria a andar descalço no começo da primavera e
continuaria assim até o fim do outono.
Daria mais voltas na minha rua,
contemplaria mais amanheceres e brincaria com mais crianças,
se tivesse outra vez uma vida pela frente.
Mas, como sabem, tenho 85 anos
e sei que estou morrendo."

As mensagens do poema "Instantes" são belíssimas,  foi escrito por Nadine Stair. Outros afirmam que existe uma publicação desse poema na Seleções Reader's Digest de outubro de 1953, do escritor e humorista Don Herold (1889-1966). Acho que, como humorista, ele deve estar rindo no céu, vendo a confusão que seu poema foi capaz de causar nesta Terra.

domingo, 22 de junho de 2014

ANGÚSTIA - Graciliano Ramos



alagoano Graciliano Ramos (1892-1953) é autor de alguns dos principais romances da literatura brasileira, como "Vidas Secas" (1938). O marco inicial de sua carreira, porém, está nos relatórios que redigiu quando era prefeito da cidade de Palmeira dos Índios, entre 1928 e 1930. A forma de escrever, ao mesmo tempo concisa, crítica e irônica, despertou o interesse do editor carioca Augusto Schmidt, que o animou a publicar "Caetés" (1933), seu livro de estreia.

Essa obra e as duas seguintes, "São Bernardo" (1934) e "Angústia" (1936), podem ser consideradas uma trilogia marcada pelo fato de serem narradas em primeira pessoa, descrevendo estados de alma de seres em constante questionamento com eles mesmos e com o mundo.

Em "Angústia", esse sentimento se faz presente da primeira até a última página de um texto que mostra o universo psicológico de 
Luís da Silva. Funcionário público, 35 anos, trabalhando na Diretoria do Tesouro, em Maceió, Estado de Alagoas, ele escreve também artigos sob encomenda para jornais com o objetivo de aumentar a renda. Além disso, vê o noivado com a vizinha, Marina, terminar devido ao poder econômico do gordo e risonho conquistador de mulheres Julião Tavares, um homem rico, sócio de uma empresa de secos e molhados.
Angústia e violência
Cada vez mais desgostoso com a profissão e com a própria existência, Luís tem sua vida transformada com uma atitude extrema. Ao saber que a sua amada Marina, frívola e fútil, fora seduzida e abandonada, grávida, e que o concorrente já estava envolvido com outra mulher, começa a ter a ideia de assassiná-lo - e concretiza a ação por meio de estrangulamento com uma corda, que ganhara de um mendigo que periodicamente lhe pedia comida. Em seguida, o coloca pendurado no galho de uma árvore para simular suicídio.

Essa ação, descrita ao final do livro, é na verdade o fato motivador de toda a narrativa, pois a angústia do começo da obra, está fortemente relacionada ao ato violento que cometeu, no qual se liberta não só do rival afetivo, mas das suas mais variadas frustrações em relação a si mesmo e ao mundo circundante.

Como é característico de seus textos, Graciliano oferece um romance marcado por um protagonista dominado pelo pessimismo e negativismo. Suas análises psicológicas e sociais, acompanhadas sempre de um estilo despojado e seco, resultam em personagens ensimesmados.
Miséria existencial
Com pouco dinheiro, morando numa casa pobre de um bairro afastado, Silva tem um histórico de familiares que aprofundam a sua miséria existencial: o avô Trajano, latifundiário decadente e bêbado, e o pai Camilo Pereira da Silva, preguiçoso, mas leitor ávido. São indícios de uma vida sem sentido que vai carcomendo o narrador.

Parágrafo a parágrafo, o protagonista é assombrado por esses e outros fantasmas de seu passado. Afunda-se num universo de faltas ao emprego, bebida, fumo e dívidas. A economia das palavras desnuda justamente um triste estar no mundo. Elas atravessam a alma do leitor como um punhal a mostrar um sofrimento marcado pela desilusão, pelo desgosto e pela frustração.

O conflito interno do narrador e seu sentimento de miséria de estar no mundo caracterizam "Angústia" como um trabalho significativo dentro do universo de Graciliano Ramos, um prosador ímpar em seu exercício de mostrar a dor com o uso contido e exato da palavra.
Oscar D'Ambrósio, Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação é jornalista, mestre em Artes pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista (Unesp), crítico de arte e integra a Associação Internacional de Críticos de Artes (Aica - Seção Brasil).