Eu tenho três: uma índigo tradicional, que tem uns
seis anos; uma bem mais antiga, de um azul desbotado pelo tempo, aguado, já
puída, que faz o papel de vigilante do peso, pois é do tempo em que minha
cintura se comportava melhor; e uma branca, a mais nova, de uns cinco anos, que
entrou no lugar de outra igualzinha que se rasgou no joelho. São suficientes
para as situações e combinações, mas surpreendo-me com uma mulher, na página de
moda de um grande jornal, contando vantagem: diz que tem trinta e tantas calças
jeans, e sempre acha que precisa de mais uma, quando a vê na loja. Algum
detalhe torna a nova calça "necessária"; ela "precisa"
daquele jeans.
Você realmente precisa de doze
pares de óculos escuros? Já não é adequado dizer "óculos de sol",
porque é moda usá-los dentro de shoppings e até em discotecas, na maior
escuridão. Eles se tornaram algo mais do que óculos: são máscaras, aquela coisa
que o Spirit dos quadrinhos botava nos olhos ou que o Fantasma botava para
virar outra pessoa. Eles fazem a mágica da troca de personalidade.
De quantos celulares você
precisa? Apareceu no jornal uma mulher que tem dúzias. Para quê, não fiquei
sabendo, bastou-me olhar a foto da tonta com aquele mostruário de celulares,
aquele despropósito. O apelo do modelo novo é irresistível para esse tipo de
gente, que não suporta a ideia de estar "desatualizada" e só se
considera "in", incluída, quando possui aquela coisa que acaba de ser
lançada.
De quantas camisetas você
precisa? Bom, o número de camisetas que as pessoas têm é incontrolável. Nem
sempre é a gente que compra. Elas viraram "o" presente. São fáceis de
achar, têm uso, têm graça. A gente nem compra camisetas, ganha.
E tênis, de quantos você precisa?
Tenho uma amiga, nem é tão jovem, que tem dezoito pares. Minha filha chegou a
ter uns doze. E ela tem uma amiga que possui 27. Não consigo entender o porquê
ou o para quê. Só quem tem é que sabe as razões.
Brincos. É comum as mulheres
terem trinta, quarenta, sessenta pares de brincos. Vão comprando e acumulando
ao longo da vida, vão ganhando. Não conseguem passar por uma bijuteria ou
joalheria sem provar diante do espelho um pequeno penduricalho nas orelhas. E
compram, não resistem a três provadas.
Carros! Você precisa de mais do
que um carro? Há pessoas que têm três, quatro. Como se houvesse grande
diferença entre usar um e outro como condução. Para viajar, sim, o tipo faz
diferença, e nesse caso poderiam comprar um para as duas funções. Preferem
ostentar.
Imelda Marcos gostava de sapatos, tinha 3 000,
comprados com o suor do povo filipino. Já vi foto de uma perua brasileira
exibindo sua coleção de mais de duas centenas de calçados. E trinta bolsas de
grife. De quantas bolsas você precisa?
É comum o consumista não conseguir
escolher entre uma coisa e outra – porque escolher uma seria perder a outra – e
para pôr fim à angústia leva as duas. Na infância dos consumistas faltaram ou
falharam a orientação na compra e o apoio à decisão tomada. Frustrações da
infância pedem compensações quando o dinheiro permite. Mas há consumistas
pobres, que compram quinquilharias baratas e desnecessárias na Rua 25 de Março,
enquanto as poderosas compram supérfluos caríssimos na Daslu.
Coleções não são a mesma coisa. Você coleciona
bolinhas de gude, palitos de picolé, caixas de fósforos, lápis, figurinhas,
rodelas de chope, rolhas, enfim, coisas que não valem nada, e coleciona coisas
que chegam a valer muito, como selos. Não têm utilização prática. É diferente
do consumo, de acumular bens de uso porque não consegue se controlar.
É
diferente também de juntar raridades. Um apresentador de televisão tinha
dezenas de relógios de pulso raros, antigos. É diferente, dizia, de ter um
monte de relógios mais caros do que raros, de fabricação e uso atuais. De
quantos relógios você precisa?
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