domingo, 28 de outubro de 2012

O GATO PRETO

Pedro, desempregado há mais de dois anos, sustentava a mulher, quatro filhas e a pinga vendendo churrasco na entrada da favela. O emaranhado de vielas que separavam os barracos possuía apenas uma entrada e era ali que Pedro colocara sua tosca churrasqueira feita com dois tijolos de cimento e uma grelha velha de forno de fogão. Tinha uma clientela certa e satisfeita. Para muitos, o churrasco era a única refeição noturna e sempre havia uma pinga para beber. Outros compravam dois ou três e levavam para casa para que os filhos e esposa também comessem o churrasco de Pedro.
Pedro morava num dos inúmeros barracos da favela. Ele e a mulher vieram do norte em busca de uma vida melhor. No início, ele conseguiu trabalhar como servente nas obras que havia pela cidade.
 Com a crise ficou desempregado. Sua esposa trabalhava como empregada diarista. O diabetes impediu que ela continuasse. Lavava e passava roupa para algumas famílias. Tinham seis filhos, quatro moravam com eles, as meninas, e dois, os meninos, não tinham notícias deles.Estavam no mundo.
Todos os dias, após o almoço, Pedro saía de casa dizendo que ia comprar mais carne para os churrascos. Levava um isopor com gelo dentro de sacos para conservar a carne. Ele tomava um ônibus que o levava até um sítio cheio de gatos.
 Entrava, escondia-se no mato e atraia os gatos com cabeças de peixe que apanhava no lixo do mercado municipal. Quando dois ou três gatos se aproximavam para comer os peixes, matava-os a pauladas. Sempre cinco gatos. Colocava os gatos no isopor e saía do sítio.
 Chegando em casa se trancava na cozinha. A mulher e as filhas, assistindo televisão, não se preocupavam com o que ele fazia. Depois de limpos, Pedro colocava a carne nos espetos e guardava no congelador da geladeira.
O couro, as tripas e os ossos, enterrava no quintal.À noite vendia o seu delicioso churrasco de carne de primeira para a favela inteira.
Tudo corria bem nos negócios até que um dia, no sítio, depois de ter matado três gatos,deparou-se com uma gata amamentando quatro gatinhos. Pedro não pensou duas vezes:matou a gata e os quatro filhotes.
Guardou a gata no isopor e jogou os filhotes no mato.
Quando se virou, viu que um gato preto o observava. Sentiu que o gato presenciara tudo o que ele fizera. Um arrepio correu em sua espinha e o fez estremecer. Recuperou-se.
Tirou algumas cabeças de peixe do saco e tentou atrair o gato preto. Ele não se mexeu e continuou olhando fixamente para Pedro. Mais dois gatos apareceram e comeram as cabeças. P
edro os matou e partiu. Olhou para trás e viu que o gato o seguia. Apressou o passo, andou rápido, correu. Conseguiu despistar o gato.
Quando chegou em casa foi para a cozinha e preparou os gatos.Todas as vezes que voltava ao sítio, o gato preto o seguia e presenciava o que ele fazia.Pedro sentia-se incomodado com a presença do gato e não conseguia atraí-lo para matá-lo.
À noite estava no seu lugar habitual vendendo churrasco e pinga quando um carro bateu no poste de onde saía “os gatos” que iluminavam todas as casas da favela.
 Tudo ficou às escuras.Em sua casa, a mulher e as crianças acenderam velas. Uma das meninas colocou uma vela perto da roupa que estava sobre o sofá para ser passada.
Deitaram-se e dormiram. Acordaram com o barraco tomado pelas chamas. Logo o fogo se espalhou para os outros barracos.
Os bombeiros chegaram, mas não conseguiram vencer o fogo.
A favela foi destruída pelo fogo.Muitos moradores foram levados ao hospital porque se intoxicaram com a fumaça tentando salvar seus poucos bens.
Apenas cinco pessoas morreram: a esposa e as quatro filhas de Pedro. Elas foram encontradas carbonizadas. Morreram abraçadas no meio da casa. Quando Pedro soube da notícia ele ouviu um miado e viu o gato preto se afastando. 


História retirada do livro O pacto maldito e outras histórias de morte de Silva, José Cláudio da, 1959



quinta-feira, 25 de outubro de 2012

ALMA DE GATO -Ademar Vidal


Entre os mitos da rua Direita existe um outro que vive nos quintais das casas de residência. Geralmente os quintais dessa rua, são pequenos, com um mesmo tipo retangular, cercados de muros e mais ou menos enfeitados de fruteiras. Nesta área restrita habita a alma de gato. Não tem hora para aparecer às crianças desobedientes. É uma sombra que passa numa esquina de parede; uma sombra que de repente se some atrás de uma porta ou de um móvel, ou que faz uma árvore do jardim balançar levemente; ou ainda um barulho que se ouve perto ou longe. Tudo serve. A alma de gato dispõe de uma agilidade rara. Durante o dia apenas se vê o impreciso. Ou, melhor: nada se vê, sente-se. A sensibilidade é que fica alerta e colhe os movimentos como se fora antena de rádio.

A luz do dia desencanta o mistério, tornando a vida mais real. Mas quando entra a noite, com todo o seu cortejo de bruxos, então é que a alma de gato começa a ser notada materialmente. Não se espantem: materialmente. Ela mostra toda a conformação física de um gato comum. Gato preto. Os olhos destilam luminosidades de fogo. A luz desses olhos é vermelha — e é de tanta intensidade que parece originária de archotes. O destino desse bicho não é arranhar, morder ou ocasionar males semelhantes. O seu destino tem formas mais suaves. Ele só se apresenta para despertar medo aos meninos. O seu vulto rápido na apresentação consegue obter o milagre de respeito só comparável a outros mitos de grande influência na imaginação infantil.

O prestígio da alma de gato toma conta de toda uma casa, principalmente o quintal, onde vive e reina com poderes imperiais. Com o dia o menino brinca solto e feliz no quintal de sua casa. A alma do gato anda por longe, nem se sente o menor sintoma. Porém, de súbito o vento balança fortemente o arvoredo e, se alguém disser alguma palavra sobre assombração, ou olhar cheio de curiosidade para um ponto qualquer, é o bastante — todos se lembram logo da alma de gato, enquanto uma onda dec receio se avoluma e se ergue ameaçadora. Quando chega a noite, o fantasma fica senhor absoluto dos quintais. Nenhum menino tem coragem de ir lá fora sem ser acompanhado de gente grande. Não vai. Mesmo que a noite não seja escura, que a lua ilumine e dissipe as sombras, ainda assim o quintal se acha invadido do mistério da alma de gato, não sendo raro se notar um moviniento, por mais sutil, que venha a confirmar a existência do mito. Às vezes é mesmo um gato que passa, ou um morcego que chia ou que põe abaixo um sapoti.

Os gatos da rua Direita são uns danados durante a noite. Fazem correrias medonhas. Afastam as telhas dos seus lugares. Brigam, só brigam por amor. Fazem uma gritaria infernal. E a raça cada vez mais se multiplica. A população de gatos anda quase em parelha com a população de gente. Esse barulho noturno é que mais infunde respeito e receio às crianças. Então, quando não podem dormir, e que a insônia lhes toma todas as preocupações, fazendo-as ficar de olho duro e enxuto, a rumorosa batalha dos gatos tem uma significação terrível. Raro é o menino que fica no seu berço ou que não reclama uma pessoa maior ao seu lado. A alma de gato toma posição e demonstra prestígio avassalador ao lado de outros duendes. A conseqüência desse temor traz certo descanso aos pais, principalmente às criadas, que são as que mais fazem ameaças e que, a todo momento, lembram os poderes extraordinários do mito animal.

O estranho nisso tudo é que nenhum malefício físico imaginário se pode esperar. Não é como outros fantasmas que acenam com a morte, que costumam carregar as crianças para longe, ameaçando, fazendo longas e maçantes viagens. A alma de gato é como se fora alma do outro mundo: só faz medo e mais nada; nem sequer se usa da velha frase: "Ele vem buscar você".
(Vidal, Ademar. Lendas e superstições; contos populares brasileiros. Rio de Janeiro, Empresa Gráfica O Cruzeiro, 1950, p.33-34)


 
 

sábado, 20 de outubro de 2012

O LIXO Luís Fernando Veríssimo

Encontram-se na área de serviço. Cada um com seu pacote de lixo. É a primeira vez que se falam.
- Bom dia...
- Bom dia
- A senhora é do 610.
 - E o senhor do 612
- É.
 - Eu ainda não lhe conhecia pessoalmente...
 - Pois é... - Desculpe a minha indiscrição, mas tenho visto o seu lixo...
 - O meu quê?
 - O seu lixo.
 - Ah...
 - Reparei que nunca é muito. Sua família deve ser pequena...
- Na verdade sou só eu. - Mmmm. Notei também que o senhor usa muito comida em lata.
- É que eu tenho que fazer minha própria comida. E como não sei cozinhar...
- Entendo.

 - A senhora também...
 - Me chame de você.
- Você também perdoe a minha indiscrição, mas tenho visto alguns restos de comida em seu lixo. Champignons, coisas assim...
 - É que eu gosto muito de cozinhar. Fazer pratos diferentes. Mas, como moro sozinha, às vezes sobra...
- A senhora... Você não tem família?
 - Tenho, mas não aqui.
 - No Espírito Santo.
- Como é que você sabe?
 - Vejo uns envelopes no seu lixo. Do Espírito Santo.
 - É. Mamãe escreve todas as semanas.
 - Ela é professora?
- Isso é incrível! Como foi que você adivinhou?
- Pela letra no envelope. Achei que era letra de professora.
 - O senhor não recebe muitas cartas. A julgar pelo seu lixo.
- Pois é... - No outro dia tinha um envelope de telegrama amassado.
- É.
 - Más notícias?
- Meu pai. Morreu.
 - Sinto muito.
- Ele já estava bem velhinho. Lá no Sul. Há tempos não nos víamos.
- Foi por isso que você recomeçou a fumar?
- Como é que você sabe?
 - De um dia para o outro começaram a aparecer carteiras de cigarro amassadas no seu lixo.
- É verdade. Mas consegui parar outra vez.
 - Eu, graças a Deus, nunca fumei.
- Eu sei. Mas tenho visto uns vidrinhos de comprimido no seu lixo...
- Tranquilizantes. Foi uma fase. Já passou.
- Você brigou com o namorado, certo?
- Isso você também descobriu no lixo?
- Primeiro o buquê de flores, com o cartãozinho, jogado fora. Depois, muito lenço de papel.
 - É, chorei bastante, mas já passou.
- Mas hoje ainda tem uns lencinhos...
- É que eu estou com um pouco de coriza.
- Ah. - Vejo muita revista de palavras cruzadas no seu lixo.
 - É. Sim. Bem. Eu fico muito em casa. Não saio muito. Sabe como é.
 - Namorada?
- Não.
- Mas há uns dias tinha uma fotografia de mulher no seu lixo. Até bonitinha.
- Eu estava limpando umas gavetas. Coisa antiga.
 - Você não rasgou a fotografia. Isso significa que, no fundo, você quer que ela volte.
- Você já está analisando o meu lixo!
- Não posso negar que o seu lixo me interessou.
- Engraçado. Quando examinei o seu lixo, decidi que gostaria de conhecê-la. Acho que foi a poesia
. - Não! Você viu meus poemas?
- Vi e gostei muito
. - Mas são muito ruins!
- Se você achasse eles ruins mesmo, teria rasgado. Eles só estavam dobrados.
 - Se eu soubesse que você ia ler...
 - Só não fiquei com eles porque, afinal, estaria roubando. Se bem que, não sei: o lixo da pessoa ainda é propriedade dela?
- Acho que não. Lixo é domínio público.
- Você tem razão. Através do lixo, o particular se torna público. O que sobra da nossa vida privada se integra com a sobra dos outros. O lixo é comunitário. É a nossa parte mais social. Será isso?
- Bom, aí você já está indo fundo demais no lixo. Acho que... - Ontem, no seu lixo...
- O quê?
- Me enganei, ou eram cascas de camarão?
- Acertou. Comprei uns camarões graúdos e descasquei.
 - Eu adoro camarão.
- Descasquei, mas ainda não comi. Quem sabe a gente pode...
 - Jantar juntos?
- É.
 - Não quero dar trabalho.
- Trabalho nenhum.
 - Vai sujar a sua cozinha?
- Nada. Num instante se limpa tudo e põe os restos fora.
- No seu lixo ou no meu?

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

O homem que espalhou o deserto - Ignácio de Loyola.

Quando menino, costumava apanhar a tesoura da mãe e ia para o quintal, cortando folhas das árvores.

 Havia mangueiras, abacateiros, ameixeiras, pessegueiros e até mesmo jabuticabeiras. Um quintal enorme, que parecia uma chácara e onde o menino passava o dia cortando folhas. A mãe gostava, assim ele não ia para a rua, não andava em más companhias. E sempre que o menino apanhava o seu caminhão de madeira (naquele tempo, ainda não havia os caminhões de plástico, felizmente) e cruzava o portão, a mãe corria com a tesoura: tome filhinho, venha brincar com as suas folhas. Ele voltava e cortava. As árvores levavam vantagem, porque eram imensas e o menino pequeno.

O seu trabalho rendia pouco, apesar do dia-a-dia constante, de manhã à noite.

Mas o menino cresceu, ganhou tesouras maiores. Parecia determinado, à medida que o tempo passava, a acabar com as folhas todas. Dominado por uma estranha impulsão, ele não queria ir à escola, não queria ir ao cinema, não tinha namoradas ou amigos. Apenas tesouras, das mais diversas qualidades e tipos. Dormia com elas no quarto. À noite, com uma pedra de amolar, afiava bem os cortes, preparando-as para as tarefas do dia seguinte.
Às vezes, deixava aberta a janela, para que o luar brilhasse nas tesouras polidas.A mãe, muito contente, apesar do filho detestar a escola e ir mal nas letras. Todavia, era um menino comportado, não saía de casa, não andava em más companhias, não se embriagava aos sábados como os outros meninos do quarteirão, não frequentava ruas suspeitas onde mulheres pintadas exageradamente se postavam às janelas, chamando os incautos. Seu único prazer eram as tesouras e o corte das folhas.
Só que, agora, ele era maior e as árvores começaram a perder. Ele demorou apenas uma semana para limpar a jabuticabeira. Quinze dias para a mangueira menor e vinte e cinco para a maior. Quarenta dias para o abacateiro que era imenso, tinha mais de cinquenta anos. E seis meses depois, quando concluiu, já a jabuticabeira tinha novas folhas e ele precisou recomeçar.
Certa noite, regressando do quintal agora silencioso, porque o desbastamento das árvores tinha afugentado pássaros e destruído ninhos, ele concluiu que de nada adiantaria podar as folhas. Elas se recomporiam sempre. É uma capacidade da natureza, morrer e reviver.
Como o seu cérebro era diminuto, ele demorou meses para encontrar a solução: um machado.
Numa terça-feira, bem cedo, que não era de perder tempo, começou a derrubada do abacateiro. Levou dez dias, porque não estava habituado a manejar machados, as mãos calejaram, sangraram. Adquirida a prática, limpou o quintal e descansou aliviado. Mas insatisfeito, porque agora passava os dias a olhar aquela desolação, ele saiu de machado em punho, para os arredores da cidade. Onde encontrava árvore, capões, matos, atacava, limpava, deixava os montes de lenha arrumadinhos para quem quisesse se servir. Os donos dos terrenos não se importavam, estavam em via de vende-los para fábricas ou imobiliárias e precisavam de tudo limpo mesmo.
E o homem do machado descobriu que podia ganhar a vida com o seu instrumento. Onde quer que precisassem derrubar árvores, ele era chamado. Não parava. Contratou uma secretária para organizar uma agenda. Depois, auxiliares. Montou uma companhia, construiu edifícios para guardar machados, abrigar seus operários devastadores. Importou tratores e máquinas especializadas do estrangeiro. Mandou assistentes fazerem cursos nos Estados Unidos e Europa. Eles voltaram peritos de primeira linha. E trabalhavam, derrubavam. Foram do sul ao norte, não deixando nada em pé. Onde quer que houvesse uma folha verde, lá estava uma tesoura, um machado, um aparelho eletrônico para arrasar.
E enquanto ele ficava milionário, o país se transformava num deserto, terra calcinada. E então, o governo, para remediar, mandou buscar em Israel técnicos especializados em tornar férteis as terras do deserto. E os homens mandaram plantar árvores. E enquanto as árvores eram plantadas, o homem do machado ensinava ao filho sua profissão.

 (BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Cadeiras proibidas. Rio de Janeiro. Editora Codecri, 1979)

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Rubem Alves - Texto "Saco de Brinquedos"


...Eu quis transcrever esse texto, hoje, porque talvez você entenda, de uma vez por todas, que embora cresçamos, continuamos querendo brincar, como crianças.
Você admira o outro, em última análise, por imaginar o tanto de brincadeira que pode estar guardada dentro dele, pra vocês brincarem juntos; e se depois de conhecer o saco de brinquedos que ele traz você ainda não se cansa, e continua ficando feliz só de pensar em brincar com ele, e o mesmo se dá entre ele e você... vocês têm tudo para ser felizes de verdade!
 
 
Meu pai me contou que, quando era menino, no início do século passado, guardava seus brinquedos num saco. Os brinquedos que meu pai menino guardava no saco: latas vazias, pedaços de barbante, sementes, sabugos de milho, botões, pedaços de pau, pedrinhas e todo tipo de coisas inúteis. Quando alguém aparecia para visitar minha avó ele pegava o saco de brinquedos e o esvaziava diante da visita. Certamente achava seus brinquedos interessantíssimos! A mãe dele ficava furiosa e lhe aplicava o devido corretivo de chineladas depois que a visita ia embora. A chinela era um dos itens favoritos que minha avó guardava no saco de brinquedos dela. As crianças continuam as mesmas. Ainda gostam de mostrar brinquedos. A gente cresce e continua criança. "Em todo homem há uma criança que deseja brincar..." (Nietzsche). E todos temos o nosso saco de brinquedos. A fala somos nós abrindo o saco e despejando brinquedos... O saco de brinquedos..
 

http://blogdasuzi.blogspot.com.br/2009/10/um-texto-de-rubem-alves-sobre-crianca.html

sábado, 6 de outubro de 2012

A menina que roubava livros-Markus Zusak

 

Sinopse 

A trajetória de Liesel Meminger é contada por uma narradora mórbida, surpreendentemente simpática. Ao perceber que a pequena ladra de livros lhe escapa, a Morte afeiçoa-se à menina e rastreia suas pegadas de 1939 a 1943. Traços de uma sobrevivente: a mãe comunista, perseguida pelo nazismo, envia Liesel e o irmão para o subúrbio pobre de uma cidade alemã, onde um casal se dispõe a adotá-los por dinheiro. O garoto morre no trajeto e é enterrado por um coveiro que deixa cair um livro na neve. É o primeiro de uma série que a menina vai surrupiar ao longo dos anos. O único vínculo com a família é esta obra, que ela ainda não sabe ler.
Assombrada por pesadelos, ela compensa o medo e a solidão das noites com a conivência do pai adotivo, um pintor de parede bonachão que lhe dá lições de leitura. Alfabetizada sob vistas grossas da madrasta, Liesel canaliza urgências para a literatura. Em tempos de livros incendiados, ela os furta, ou os lê na biblioteca do prefeito da cidade.
A vida ao redor é a pseudo-realidade criada em torno do culto a Hitler na Segunda Guerra. Ela assiste à eufórica celebração do aniversário do Führer pela vizinhança. Teme a dona da loja da esquina, colaboradora do Terceiro Reich. Faz amizade com um garoto obrigado a integrar a Juventude Hitlerista. E ajuda o pai a esconder no porão um judeu que escreve livros artesanais para contar a sua parte naquela História. A Morte, perplexa diante da violência humana, dá um tom leve e divertido à narrativa deste duro confronto entre a infância perdida e a crueldade do mundo adulto, um sucesso absoluto - e raro - de crítica e público.

A Menina que odiava livros – Manjusha Pawagi e Jeanne Franson

Esta é a história de Meena, uma garota que simplesmente odiava os livros. Mas ela não conseguia ficar longe deles, porque em sua casa eles estavam por toda parte: nos armários da cozinha, nas gavetas, nas mesas, nos guarda-roupas e nas cômodas. Estavam também sobre o sofá, alguns entulhados na banheira e outros empilhados nas cadeiras. Mas um dia o gatinho de Meena derrubou uma pilha enorme de livros infantis. Abertas pela primeira vez, as páginas dos livros libertaram os personagens e animais das histórias, que invadiram a sala, fazendo uma grande bagunça. Esse acontecimento mágico fez Meena viajar pelo fantástico mundo da literatura.


LIVRO SELECIONADO PELO CANADIAN CHILDREN’S BOOK CENTRE.
INDICADO PARA O PRÊMIO BLUE SPURE.
 PUBLICADO TAMBÉM NA AUSTRÁLIA E NA FRANÇA.