... Mula sem
cabeça...lobisomem...
Mula sem cabeça e lobisomem estão entre os mitos e costumes já assustaram muitas
crianças e adultos no período de preparação até a Páscoa
Irati - Várias lendas e crendices permeiam o imaginário popular no
período da Quaresma, os quarenta dias desde a quarta-feira de cinzas até a
quinta-feira da Semana Santa. Hoje, essas tradições folclóricas estão bem mais
reduzidas, acabaram se perdendo com o tempo. Porém, para pessoas mais velhas, e
em alguns lugares no interior, a Quaresma ainda é um período de recolhimento,
oração, e de dormir cedo, principalmente na sexta-feira, pois, acredita-se que
nesse dia a mula sem cabeça e o lobisomem estão soltos no mundo.
A dona de
casa Etelvina Bendo, hoje com 65 anos, lembra que quando era jovem, as
tradições da Semana Santa eram seguidas a risca na sua casa. “Minha mãe sempre
contava que se passasse na Sexta-Feira Santa perto de um cemitério, você iria
ver algum morto caminhando, além disso, durante toda sexta-feira da Quaresma
não podia sair à noite que poderia ver o lobisomem. E dançar, só até a meia
noite da quarta-feira de cinzas, se passasse disso, você poderia ver o demônio.
A mãe dizia assim: pula, pula até meia noite, porque depois o diabinho aparece.
E, se a mãe descobrisse que passamos da meia-noite no carnaval, era castigo em
certa”. Costumes como esse eram seguidos em muitos locais, e para quem
não obedecesse o castigo vinha, se não fosse obra do acaso era dado em casa,
pelos pais.
“Na
Sexta-Feira Santa era proibido olhar no espelho porque viria outra imagem, algo
horripilante, como a figura do próprio demônio. Também não se podia ouvir rádio,
cantar, assobiar, ou, qualquer coisa que demonstrasse alegria”. Assim era a
Quaresma, e principalmente a Semana Santa, na casa de Murilo Walter Teixeira,
74, que se recorda da infância, quando em sua casa, vários costumes e crendices
eram respeitados durante esse período.
Muitas
outras são as lendas da Quaresma, que variam de região para região. A seguir,
algumas das mais comuns e dos costumes que eram respeitados no período.
A Mula sem cabeça – Reza a
lenda que a mula sem cabeça é uma mulher que devora cadáveres nos cemitérios ou
se alimenta de sangue humano. Nas noites de sexta-feira da Quaresma e durante
toda a Semana Santa, a mula sem cabeça fica solta, correndo pelos campos e até
dentro das cidades. E que ninguém veja a mula, pois, se ver e ficar olhando,
fica maluco.
Outro que amedronta nesse período é o Lobisomem. Apesar de ser conhecido
também em outras partes do mundo, o lobisomem brasileiro é um pouco diferente
dos de outros lugares. No Brasil, o lobisomem é um homem pálido, de aspecto
doentio e que por ser filho de incesto ou por ter nascido depois de uma série
de sete filhas, é condenado pelo destino a virar lobo, cachorro, bezerro ou
porco, em dias e horas determinadas (geralmente as terças e sextas-feiras, de
meia-noite às duas horas da madrugada e principalmente na Semana Santa e
Quaresma). Depois de transformado, têm que fazer suas corridas: visitar
sete cemitérios, sete colinas, sete encruzilhadas, sete igrejas, para voltar a
ter forma humana.
A procissão dos mortos: Na
noite de Sexta-Feira Santa, há uma crença que fala de uma espécie de procissão
dos mortos. Segundo ela, os mortos saem dos cemitérios, todos vestidos de
branco, saudando o aparecimento do Cristo entre eles, tal como aconteceu depois
que Jesus morreu no Monte Calvário e que centenas de mortos ressuscitaram.
Dizem que só vê a procissão dos mortos quem sai à noite de Sexta-Feira Santa
para festar.
A Sexta-Feira da Paixão é a que mais é alvo da crendice e superstição
popular. Na Sexta-Feira Santa não se pode fazer nada, sob pena de
castigo. “Se pregar alguma coisa nesse dia, seria o mesmo que estar pregando
Cristo na cruz, dizem os mais antigos; um homem foi caçar nesse dia e acertou
um veado pardo, quando se aproximou viu que matou seu próprio filho; outro que
também foi caçar acertou uma capivara, cujo tiro acertou no meio do animal e
uma parte do bicho continuou correndo para um lado e outra para outro lado;
dançar no tempo da Quaresma cria rabo ou pés de cabra, igual às do demônio”,
eram as histórias que o professor de história Ariel José Pires mais ouvia a
respeito da Quaresma quando criança.
Outra
tradição de muitos fiéis católicos era jejuar, com abstinência de carne em
todas as quartas e sextas de Quaresma e na Semana Santa inteira. Hoje, esse
costume caiu bastante em desuso e não é uma imposição da igreja.
Segundo outra tradição, nesse dia não se pode cortar a unha, se o ato for
feito, dependendo da região do país, acredita-se que “faz unheiro”, ou “dá dor
de dente”, ou “dá inflamação nos dedos”. Não se varre a casa, porque “faz mal”,
ou porque “se varre os cabelos de Nosso Senhor”, ou, para não alvoroçar os
bichos ruins; escorpiões, aranhas, etc. Também em tal dia, não se deve fazer a
barba, nem pentear o cabelo. E “o café será tomado amargo, porque os judeus
deram a Jesus fel amargurado”. Para muitas pessoas, trabalhar nesse dia então,
nem pensar.
O dia da malvadeza: É
na Quinta-feira Santa, quando começa a anoitecer. Bandos de foliões invadem
currais, soltam o gado, enxotam as galinhas, estragam plantações. Fazem, enfim,
qualquer tipo de malvadeza. Isso é praticado principalmente em fazendas.
Furtos da Sexta-Feira Santa:
Em alguns lugares era costume roubar na noite de sexta-feira e dizia-se que
não era pecado, porque o Senhor estava morto e não podia ver. O roubo, porém, nunca
se efetivava para prejudicar alguém, roubavam frangos e depois levavam à casa
do dono, no geral um conhecido, para que fossem preparados para o banquete de
Aleluia. Os principais alvos dos roubos eram galinheiros.
Malhação do Judas: É
uma tradição malhar o Judas no Sábado de Aleluia. E em muitas cidades do Brasil
esse costume ainda é mantido. O motivo da malhação de um boneco que representa
o Judas. É uma espécie de vingança do que ele fez para Jesus, é demonstração de
revolta pela atitude do traidor.