sábado, 14 de setembro de 2013

Excluídos - FERREIRA GULLAR


DE ALGUM tempo para cá, a parte da sociedade que mora em favelas e bairros pobres é qualificada como "excluída". Ou seja, os moradores da Rocinha e do Vidigal, por exemplo, não vivem ali porque não dispõem de recursos para morar em Ipanema ou Leblon, e sim porque foram excluídos da comunidade dos ricos. E eu, com minha mania de fazer perguntas desagradáveis, indago: mas alguma vez aquele pessoal da Rocinha morou nos bairros de classe média alta e dos milionários? Afora um ou outro que possa ter se arruinado socialmente ou que tenha optado por residir ali, todos os demais foram levados a isso por sua condição econômica ou porque ali nasceram. Então por que considerá-los "excluídos", se nunca estiveram "incluídos"?
No meu pouco entendimento, excluído é quem pertenceu a uma entidade ou a comunidade e dela foi expulso ou impedido de nela continuar. Quem nunca pertenceu às classes remediadas ou abastadas não pode ter sido excluído delas. Mais apropriado seria dizer que nunca foi incluído. Ainda assim, se não me equivoco, incorreríamos em erro. Senão, vejamos: a Rocinha, o Vidigal, o Borel e a favela da Maré fazem parte da cidade do Rio de Janeiro, não fazem? Seria correto afirmar, então, quer seja do ponto de vista urbanístico, quer do demográfico e social, que o Rio são apenas os bairros em que reside a parte mais abastada da população? Se fizermos isso, então, sim, estaremos excluindo parte considerável do território e da gente que constitui a cidade do Rio e que, portanto, pertence a ela.
Consideremos agora a questão de outro ponto de vista. Nos morros e favelas da cidade residem cerca de 1 milhão de pessoas, que têm vida social ativa, pois trabalham, estudam, participam de organizações comunitárias e recreativas. A maioria delas trabalha fora de sua comunidade, no comércio, na indústria, no serviço público, ou desenvolve atividade informal. Logo, participa da vida econômica, cultural e esportiva da cidade. Em que sentido, então, essa gente estaria excluída? Não resta dúvida de que as famílias faveladas, na sua ampla maioria, vivem em condições precárias, tanto no que se refere ao conforto domiciliar quanto à alimentação, às condições de higiene e saneamento, educação, saúde e segurança. Mas não estão excluídas da preocupação dos políticos que, na época das eleições, vão até lá em busca de votos. Há, nessa comunidade, cabos eleitorais, pessoas que atuam em associações de bairro e fazem a ligação com os centros políticos de poder. É certo que a grande maioria dessa gente não participa da vida política, mas isso ocorre também com as demais pessoas, morem onde morarem. Por todas essas razões, somos obrigados a concluir que os pobres e favelados estão incluídos na vida econômica, social e política da sociedade.
No entanto, isso não significa que estejam em pé de igualdade com as pessoas das classes médias e ricas. Não estão e, na sua grande maioria, descendem de gerações de brasileiros que tampouco gozaram dessa igualdade. Muitos descendem de antigos escravos e de brancos pobres que, pela carência de meios e pela desigualdade que rege o processo social, jamais tiveram possibilidade de ascender econômica e socialmente. Eles não foram excluídos simplesmente porque jamais estiveram incluídos entre os mais ou menos privilegiados.
Por que, então, cientistas políticos, sociólogos e jornalistas, entre outros, falam de exclusão social? Por ignorância não será, já que todos eles estão a par do que, bem ou mal, tentei demonstrar aqui. Creio que, consciente ou inconscientemente, procura-se levar a sociedade a pensar que a desigualdade social não é conseqüência de fatores objetivos, do sistema econômico, mas sim resultado da deliberação de pessoas cruéis que empurram os mais fracos para fora da sociedade e os condenam à miséria.
Em vez de admitir que esse sistema, por visar acima de tudo o lucro e ser, por definição, concentrador da riqueza, é que dificulta, ainda que não impeça, a ascensão dos mais pobres, procura-se fazer crer que a desigualdade é fruto de decisões pessoais. Ignora-se que, no sistema capitalista, quem não tem emprego também está incluído nele, como exército de reserva de mão-de-obra, com a função de pressionar o trabalhador e limitar-lhe as reivindicações. A eliminação da miséria beneficia o sistema pois amplia o mercado consumidor. O empresário pode ser, como você ou eu, bom ou mau, generoso ou sovina, mas, como disse Marx, "o capital governa o capitalista". O problema está no sistema, não nas pessoas.

sábado, 7 de setembro de 2013

Recado ao Senhor 903 -Rubem Braga

VIZINHO
 
Quem fala aqui é o homem do 1003. Recebi outro dia, consternado, a visita do zelador do prédio, que me mostrou a carta em que o senhor reclamava contra o barulho em meu apartamento. Recebi depois a sua própria visita pessoal - devia ser meia-noite - e a sua veemente reclamação verbal. Devo dizer que estou desolado com tudo isso, e lhe dou inteira razão. O regulamento do prédio é explícito e, se não o fosse, o senhor ainda teria ao seu lado a lei e a polícia. Quem trabalha o dia inteiro tem direito ao repouso noturno e é impossível repousar no 903 quando há vozes, passos e músicas no 1003. Ou melhor: é impossível ao 903 dormir quando o 1003 se agita; pois como não sei o seu nome nem o senhor sabe o meu, ficamos reduzidos a ser dois números, dois números empilhados entre dezenas de outros. Eu, 1003, me limito a leste pelo 1005, a oeste pelo 1001, ao sul pelo Oceano Atlântico, ao norte pelo 1004, ao alto pelo 1103 e embaixo pelo 903 que é o senhor. Todos esses números são comportados e silenciosos; apenas eu e o Oceano Atlântico fazemos ruído e funcionamos fora dos horários civis; nós dois apenas nos agitamos e bramimos ao sabor da maré, dos ventos e da lua. Prometo sinceramente adotar, depois das 22 horas, de hoje em diante, um comportamento de manso lago azul. Prometo. Quem vier à minha casa (perdão, ao meu número) será convidado a se retirar às 21:45, e explicarei: o 903 precisa repousar das 22 às 7 pois às 8 deve deixar o 783 para tomar o 109 que o levará até o 527 de outra rua, onde ele trabalha na sala 305. Nossa vida, vizinho, está toda numerada,   e reconheço que ela só pode ser tolerável quando um número não incomoda outro número, mas o respeita, ficando dentro dos limites de seus algarismos. Peço-lhe desculpas - e prometo silêncio.
   Mas que me seja permitido sonhar com outra vida e outro mundo, em que um homem batesse à porta do outro e dissesse: "Vizinho, são três horas da manhã e ouvi música em tua casa. Aqui estou". E o outro respondesse: "Entra, vizinho, e come de meu pão e bebe de meu vinho. Aqui estamos todos a bailar e cantar, pois descobrimos que a vida é curta e a lua é bela".
E o homem trouxesse sua mulher, e os dois ficassem entre os amigos e amigas do vizinho entoando canções para agradecer a Deus o brilho das estrelas e o murmúrio da brisa nas árvores, e o dom da vida, e a amizade entre os humanos, e o amor e a paz."
(Rubem Braga. "Para gostar de ler". São Paulo: Ática, 1991)

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Falando Sobre Leitura | Ler, por Luís Fernando Veríssimo


Ler...

Ler é o melhor remédio.
Leia jornal...
Leia outdoor...
Leia letreiros da estação do trem...
Leia os preços do supermercado...
Leia alguém!
Ler é a maior comédia!
Leia etiqueta jeans...
Leia histórias em quadrinhos...
Leia a continha do bar...
Leia a bula do remédio...
Leia a  página do ano passado perdida no canto da pia enrolando chuchus...
Leia a vida!
Leia os olhos, leia as mãos. Os lábios e os desejos das pessoas...
Leia a interação que ocorre ou não entre física, geografia, informática, trabalho, miséria e chateação...
Leia as impossibilidades...
Leia ainda mais as esperanças...
Leia o que lhe der na telha...
...mas leia, e as ideias virão!

terça-feira, 13 de agosto de 2013

DESEJOS" ou "OS VOTOS" - Sérgio Jockymann

Pois, desejo primeiro que você ame e que amando, também seja amado,
E que se não o for, seja breve em esquecer e esquecendo, não guarde mágoa.
Desejo, pois, que não seja só, mas que se for, saiba ser sem desesperar.
Desejo também que tenha amigos e que, mesmo maus e inconseqüentes, sejam corajosos e fiéis,
E que em pelo menos um deles você possa confiar, que confiando, não duvide de sua confiança.
E porque a vida é assim, desejo ainda que você tenha inimigos, nem muitos, nem poucos,
mas na medida exata para que, algumas vezes, você se interpele a respeito de suas próprias certezas.
E que entre eles haja pelo menos um que seja justo, para que você não se sinta demasiadamente seguro.
Desejo, depois, que você seja útil, mas não insubstituivelmente útil, mas razoavelmente útil.
E que nos maus momentos, quando não restar mais nada, essa utilidade seja suficiente para manter você de pé.
Desejo ainda que você seja tolerante, não com os que erram pouco, porque isso é fácil,
mas com os que erram muito e irremediavelmente, e que essa tolerância, não se transform em aplauso nem em permissividade,
Para que assim fazendo um bom uso dela, você dê também um exemplo para os outros.
Desejo que você, sendo jovem, não amadureça depressa demais e que, sendo maduro, não insista em rejuvenescer
E
que, sendo velho, não se dedique a desesperar.
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor
E é preciso deixar que eles escorram dentro de nós.
Desejo, por sinal, que você seja triste, mas não o ano todo, nem em um mês e muito menos numa semana,
Mas apenas por um dia. Mas que nesse dia de tristeza, você descubra que o riso diário é bom,
o riso habitual é insosso e o riso constante é insano.
Desejo que você descubra, com o máximo de urgência, acima e a despeito de tudo,
Talvez agora mesmo, mas se for impossível, amanhã de manhã, que existem oprimidos, injustiçados e infelizes,
E que estão à sua volta, porque seu pai aceitou conviver com eles.
E que eles continuarão à volta de seus filhos, se você achar a convivência inevitável.
Desejo ainda que você afague um gato, que alimento um cão e ouça pelo menos um joão-de-barro erguer
triunfante o seu canto matinal;
Porque assim você se sentirá bem por nada.
Desejo também que você plante uma semente, por mais ridícula que seja, e acompanhe o seu crescimento dia-a-dia,
para que você saiba de quantas muitas vidas é feita uma árvore.
Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro, porque é preciso ser prático.
E que, pelo menos uma vez por ano, você ponha uma porção dele na sua frente e diga:
"Isso é meu". Só para que fique bem claro quem é dono de quem.
Desejo ainda que você seja frugal, não inteiramente frugal,
não obcecadamente frugal, mas apenas usualmente frugal.
Mas que esse frugalismo não impeça você de abusar quando o abuso se impõe.
Desejo também que nenhum de seus afetos morra, por ele e por você,
Mas que, se morrer, você possa chorar sem se culpar e sofrer sem se lamentar.
Desejo, por fim, que sendo mulher, você tenha um bom homem,
E que sendo homem, tenha uma boa mulher.
E que se amem hoje, amanhã, depois, no dia seguinte, mais uma vez,
E novamente, de agora até o próximo ano acabar,
E que quando estiverem exaustos e sorridentes, ainda tenham amor para recomeçar. 
E se isso só acontecer, não tenho mais nada para desejar.

* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * 

IMPORTANTE: esta poesia, de autoria de Sergio Jockymann, publicada em 1980 no Jornal Folha da Tarde, de Porto Alegre-RS, circula na internet como sendo de autoria de Victor Hugo, e assim foi publicada originalmente com o título 'Desejos'. Contactados pelo verdadeiro autor, com muito prazer desfazemos o equívoco, estabelecendo os créditos a quem de direito.

terça-feira, 30 de julho de 2013

O AFOGADO- Fernando Sabino



O AFOGADO- Fernando Sabino

- Vocês não souberam o que aconteceu com o carro dele?
Como nenhum de nós soubesse, pôs-se a contar-nos, excitado:
- Imaginem que tinha um sujeito se afogando na Praia de Botafogo e vários carros já haviam parado para ver. Ele parou atrás, junto à calçada. Então veio outro carro em disparada e bateu de cheio no dele.
- Estragou muito? – perguntou alguém da roda.
- Espere, não foi tudo: o dele, por sua vez, bateu no da frente. O da frente atropelou duas moças que iam passando. Elas ficaram feridas levemente, mas os carros ficaram completamente amassados. O dele, então, virou sanfona.
- Mas que azar! – comentou um, consternado.

- Logo aquele carro, novinho em folha! – disse outro.
- Pois foi isso: ficou em pandarecos.
- Então vai custar um dinheirão para consertar.
- Não tinha seguro? – tornou o primeiro.
- Ele não, mas o que bateu tem seguro contra terceiros: só que um seguro de cem mil não dá para cobrir o estrago de jeito nenhum.
- Além do mais, é um inferno tentar receber seguro nessas situações.
- Foi o que ele me disse. E tem os outros dois carros, que naturalmente vão pleitear parte desse seguro também.
- Mas se a culpa foi do outro, tem que pagar tudo.
- Até provar que a culpa foi do outro...
- Não houve perícia?
- Não, parece que não houve perícia.
A conversa prosseguiu entre comentários em que todos lastimavam a falta de sorte do amigo. Todos, menos eu, que me limitava a ouvir, pensativo.
- Você não disse nada – observou um deles.
É verdade, eu não disse nada, continuei calado. Não havia muito que dizer, além do que já fora dito pelos outros. Mas na realidade gostaria de saber o que foi que aconteceu com o homem que estava se afogando.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Amor... é pra gente grande...


1Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine.
2E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria.
3E ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada disso me aproveitaria.
4O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece.
5Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal;
6Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade;
7Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.
8O amor nunca falha; mas havendo profecias, serão aniquiladas; havendo línguas, cessarão; havendo ciência, desaparecerá;
9Porque, em parte, conhecemos, e em parte profetizamos;
10Mas, quando vier o que é perfeito, então o que o é em parte será aniquilado.
11Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, discorria como menino, mas, logo que cheguei a ser homem, acabei com as coisas de menino.
12Porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido.
13Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três, mas o maior destes é o amor.
Fonte - Biblia Sagrada - 1 Coríntios 13

domingo, 7 de julho de 2013

"Não te amo mais. Estarei mentindo ... ( autor desconhecido)

Leia o texto abaixo e depois leia de baixo para cima"

Não te amo mais.
Estarei mentindo dizendo que
Ainda te quero como sempre quis.
Tenho certeza que
Nada foi em vão.
Sinto dentro de mim que
Você não significa nada.
Não poderia dizer jamais que
Alimento um grande amor.
Sinto cada vez mais que
Já te esqueci!
E jamais usarei a frase
EU TE AMO!
Sinto, mas tenho que dizer a verdade
É tarde demais...
 

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Meu filho voce não merece nada - Eliane Brum







A crença de que a felicidade é um direito tem tornado despreparada a geração mais preparada








 
Ao conviver com os bem mais jovens, com aqueles que se tornaram adultos há pouco e com aqueles que estão tateando para virar gente grande, percebo que estamos diante da geração mais preparada –e, ao mesmo tempo, da mais despreparada. Preparada do ponto de vista das habilidades, despreparada porque não sabe lidar com frustrações. Preparada porque é capaz de usar as ferramentas da tecnologia, despreparada porque despreza o esforço. Preparada porque conhece o mundo em viagens protegidas, despreparada porque desconhece a fragilidade da matéria da vida. E por tudo isso sofre, sofre muito, porque foi ensinada a acreditar que nasceu com o patrimônio da felicidade. E não foi ensinada a criar a partir da dor.
Há uma geração de classe média que estudou em bons colégios, é fluente em outras línguas,viajou para o exterior e teve acesso à cultura e à tecnologia. Uma geração que teve muito mais do que seus pais. Ao mesmo tempo, cresceu com a ilusão de que a vida é fácil. Ou que já nascem prontos – bastaria apenas que o mundo reconhecesse a sua genialidade.
Tenho me deparado com jovens que esperam ter no mercado de trabalho uma continuação de suas casas – onde o chefe seria um pai ou uma mãe complacente, que tudo concede. Foram ensinados a pensar que merecem, seja lá o que for que queiram. E quando isso não acontece – porque obviamente não acontece – sentem-se traídos, revoltam-se com a “injustiça” e boa parte se emburra e desiste.
Como esses estreantes na vida adulta foram crianças e adolescentes que ganharam tudo, sem ter de lutar por quase nada de relevante, desconhecem que a vida é construção – e para conquistar um espaço no mundo é preciso ralar muito. Com ética e honestidade – e não a cotoveladas ou aos gritos. Como seus pais não conseguiram dizer, é o mundo que anuncia a eles uma nova não lá muito animadora: viver é para os insistentes.
Por que boa parte dessa nova geração é assim? Penso que este é um questionamento importante para quem está educando uma criança ou um adolescente hoje. Nossa época tem sido marcada pela ilusão de que a felicidade é uma espécie de direito. E tenho testemunhado a angústia de muitos pais para garantir que os filhos sejam “felizes”. Pais que fazem malabarismos para dar tudo aos filhos e protegê-los de todos os perrengues – sem esperar nenhuma responsabilização nem reciprocidade.
É como se os filhos nascessem e imediatamente os pais já se tornassem devedores. Para estes, frustrar os filhos é sinônimo de fracasso pessoal. Mas é possível uma vida sem frustrações? Não é importante que os filhos compreendam como parte do processo educativo duas premissas básicas do viver, a frustração e o esforço? Ou a falta e a busca, duas faces de um mesmo movimento? Existe alguém que viva sem se confrontar dia após dia com os limites tanto de sua condição humana como de suas capacidades individuais?
Nossa classe média parece desprezar o esforço. Prefere a genialidade. O valor está no dom, naquilo que já nasce pronto. Dizer que “fulano é esforçado” é quase uma ofensa. Ter de dar duro para conquistar algo parece já vir assinalado com o carimbo de perdedor. Bacana é o cara que não estudou, passou a noite na balada e foi aprovado no vestibular de Medicina. Este atesta a excelência dos genes de seus pais. Esforçar-se é, no máximo, coisa para os filhos da classe C, que ainda precisam assegurar seu lugar no país.
Da mesma forma que supostamente seria possível construir um lugar sem esforço, existe a crença não menos fantasiosa de que é possível viver sem sofrer. De que as dores inerentes a toda vida são uma anomalia e, como percebo em muitos jovens, uma espécie de traição ao futuro que deveria estar garantido. Pais e filhos têm pagado caro pela crença de que a felicidade é um direito. E a frustração um fracasso. Talvez aí esteja uma pista para compreender a geração do “eu mereço”.
Basta andar por esse mundo para testemunhar o rosto de espanto e de mágoa de jovens ao descobrir que a vida não é como os pais tinham lhes prometido. Expressão que logo muda para o emburramento. E o pior é que sofrem terrivelmente. Porque possuem muitas habilidades e ferramentas, mas não têm o menor preparo para lidar com a dor e as decepções. Nem imaginam que viver é também ter de aceitar limitações – e que ninguém, por mais brilhante que seja, consegue tudo o que quer.
A questão, como poderia formular o filósofo Garrincha, é: “Estes pais e estes filhos combinaram com a vida que seria fácil”? É no passar dos dias que a conta não fecha e o projeto construído sobre fumaça desaparece deixando nenhum chão. Ninguém descobre que viver é complicado quando cresce ou deveria crescer – este momento é apenas quando a condição humana, frágil e falha, começa a se explicitar no confronto com os muros da realidade. Desde sempre sofremos. E mais vamos sofrer se não temos espaço nem mesmo para falar da tristeza e da confusão.
Me parece que é isso que tem acontecido em muitas famílias por aí: se a felicidade é um imperativo, o item principal do pacote completo que os pais supostamente teriam de garantir aos filhos para serem considerados bem sucedidos, como falar de dor, de medo e da sensação de se sentir desencaixado? Não há espaço para nada que seja da vida, que pertença aos espasmos de crescer duvidando de seu lugar no mundo, porque isso seria um reconhecimento da falência do projeto familiar construído sobre a ilusão da felicidade e da completude.
Quando o que não pode ser dito vira sintoma – já que ninguém está disposto a escutar, porque escutar significaria rever escolhas e reconhecer equívocos – o mais fácil é calar. E não por acaso se cala com medicamentos e cada vez mais cedo o desconforto de crianças que não se comportam segundo o manual. Assim, a família pode tocar o cotidiano sem que ninguém precise olhar de verdade para ninguém dentro de casa.
Se os filhos têm o direito de ser felizes simplesmente porque existem – e aos pais caberia garantir esse direito – que tipo de relação pais e filhos podem ter? Como seria possível estabelecer um vínculo genuíno se o sofrimento, o medo e as dúvidas estão previamente fora dele? Se a relação está construída sobre uma ilusão, só é possível fingir.
Aos filhos cabe fingir felicidade – e, como não conseguem, passam a exigir cada vez mais de tudo, especialmente coisas materiais, já que estas são as mais fáceis de alcançar – e aos pais cabe fingir ter a possibilidade de garantir a felicidade, o que sabem intimamente que é uma mentira porque a sentem na própria pele dia após dia. É pelos objetos de consumo que a novela familiar tem se desenrolado, onde os pais fazem de conta que dão o que ninguém pode dar, e os filhos simulam receber o que só eles podem buscar. E por isso logo é preciso criar uma nova demanda para manter o jogo funcionando.
O resultado disso é pais e filhos angustiados, que vão conviver uma vida inteira, mas se desconhecem. E, portanto, estão perdendo uma grande chance. Todos sofrem muito nesse teatro de desencontros anunciados. E mais sofrem porque precisam fingir que existe uma vida em que se pode tudo. E acreditar que se pode tudo é o atalho mais rápido para alcançar não a frustração que move, mas aquela que paralisa.
Quando converso com esses jovens no parapeito da vida adulta, com suas imensas possibilidades e riscos tão grandiosos quanto, percebo que precisam muito de realidade. Com tudo o que a realidade é. Sim, assumir a narrativa da própria vida é para quem tem coragem. Não é complicado porque você vai ter competidores com habilidades iguais ou superiores a sua, mas porque se tornar aquilo que se é, buscar a própria voz, é escolher um percurso pontilhado de desvios e sem nenhuma certeza de chegada. É viver com dúvidas e ter de responder pelas próprias escolhas. Mas é nesse movimento que a gente vira gente grande.
Seria muito bacana que os pais de hoje entendessem que tão importante quanto uma boa escola ou um curso de línguas ou um Ipad é dizer de vez em quando: “Te vira, meu filho. Você sempre poderá contar comigo, mas essa briga é tua”. Assim como sentar para jantar e falar da vida como ela é: “Olha, meu dia foi difícil” ou “Estou com dúvidas, estou com medo, estou confuso” ou “Não sei o que fazer, mas estou tentando descobrir”. Porque fingir que está tudo bem e que tudo pode significa dizer ao seu filho que você não confia nele nem o respeita, já que o trata como um imbecil, incapaz de compreender a matéria da existência. É tão ruim quanto ligar a TV em volume alto o suficiente para que nada que ameace o frágil equilíbrio doméstico possa ser dito.
Agora, se os pais mentiram que a felicidade é um direito e seu filho merece tudo simplesmente por existir, paciência. De nada vai adiantar choramingar ou emburrar ao descobrir que vai ter de conquistar seu espaço no mundo sem nenhuma garantia. O melhor a fazer é ter a coragem de escolher. Seja a escolha de lutar pelo seu desejo – ou para descobri-lo –, seja a de abrir mão dele. E não culpar ninguém porque eventualmente não deu certo, porque com certeza vai dar errado muitas vezes. Ou transferir para o outro a responsabilidade pela sua desistência.
Crescer é compreender que o fato de a vida ser falta não a torna menor. Sim, a vida é insuficiente. Mas é o que temos. E é melhor não perder tempo se sentindo injustiçado porque um dia ela acaba.

Publicado em 17/05/2013por Clínica Alamedas






domingo, 30 de junho de 2013

LEITURA COMPARTILHADA - EF II - O segredo do Colecionador - Ana Cristina Massa


ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL II DA EMEF PROFESSORA MARILI DIAS LERAM , GOSTARAM E INDICAM ESTA AVENTURA!


NESTE SEMESTRE FIZEMOS A LEITURA COMPARTILHADA DESTA OBRA
Quem rouba um livro não rouba apenas um volume de páginas impressas, pois pode estar roubando um importante fato da História de todos os homens, principalmente se o livro em questão for um original com mais de quinhentos anos. Pior ainda, se não for livros raros, mas antigos documentos, manuscritos, mapas… Desvendar a História é igualmente uma aventura, como desvendar uma história de mistério — melhor ainda quando ambos os caminhos se fundem em uma narrativa só: Eugênio, o Gênio, Jonas, Goma, Sofia e Isadora são os Invencíveis, sempre a esquadrinhar as ruas, os lugares, os monumentos da arquitetura histórica brasileira no Rio de Janeiro.

Desta vez (no terceiro livro da série), o quinteto encasqueta com a figura pálida do novo professor de História, agarrado a uma velha pasta. Até aí, nada de extraordinário, não fosse o fato de ele ainda não ter memorizado os números do segredo que trazia anotado em um pedaço de papel…
O detalhe não passa despercebido a G que, então, decide ficar de olho. Pronto: começam as confusões, passeios, corridas de táxi, perseguições da Biblioteca Nacional até o Jardim Botânico, numa trama que envolve, mais uma vez, o detetive Sombra, um colecionador de obras raras, um ambulante mal encarado e um ladrão especializado em livros e gravuras antigas — e um manuscrito medieval do marinheiro Álvaro Velho sobre a viagem de Vasco da Gama!

Com um texto veloz, Ana Cristina Massa desvenda fatos e postais da paisagem turística, ligando-os organicamente à novela policialesca e juvenil. Além dos livros com fundo falso, as aquisições nas feiras de antiguidade e sebos da cidade, navegações com laptop e em códigos medievais, há um tempinho reservado para a descontração, o som do DJ na festa de Gênio, a troca de pares românticos, as confissões entre os irmãos Goma e Sofia e outros conflitos sentimentais.


 

sábado, 22 de junho de 2013

Consumistas por Ivan Angelo

De quantas calças jeans você precisa?

Eu tenho três: uma índigo tradicional, que tem uns seis anos; uma bem mais antiga, de um azul desbotado pelo tempo, aguado, já puída, que faz o papel de vigilante do peso, pois é do tempo em que minha cintura se comportava melhor; e uma branca, a mais nova, de uns cinco anos, que entrou no lugar de outra igualzinha que se rasgou no joelho. São suficientes para as situações e combinações, mas surpreendo-me com uma mulher, na página de moda de um grande jornal, contando vantagem: diz que tem trinta e tantas calças jeans, e sempre acha que precisa de mais uma, quando a vê na loja. Algum detalhe torna a nova calça "necessária"; ela "precisa" daquele jeans.

Você realmente precisa de doze pares de óculos escuros? Já não é adequado dizer "óculos de sol", porque é moda usá-los dentro de shoppings e até em discotecas, na maior escuridão. Eles se tornaram algo mais do que óculos: são máscaras, aquela coisa que o Spirit dos quadrinhos botava nos olhos ou que o Fantasma botava para virar outra pessoa. Eles fazem a mágica da troca de personalidade.

De quantos celulares você precisa? Apareceu no jornal uma mulher que tem dúzias. Para quê, não fiquei sabendo, bastou-me olhar a foto da tonta com aquele mostruário de celulares, aquele despropósito. O apelo do modelo novo é irresistível para esse tipo de gente, que não suporta a ideia de estar "desatualizada" e só se considera "in", incluída, quando possui aquela coisa que acaba de ser lançada.

De quantas camisetas você precisa? Bom, o número de camisetas que as pessoas têm é incontrolável. Nem sempre é a gente que compra. Elas viraram "o" presente. São fáceis de achar, têm uso, têm graça. A gente nem compra camisetas, ganha.

E tênis, de quantos você precisa? Tenho uma amiga, nem é tão jovem, que tem dezoito pares. Minha filha chegou a ter uns doze. E ela tem uma amiga que possui 27. Não consigo entender o porquê ou o para quê. Só quem tem é que sabe as razões.

Brincos. É comum as mulheres terem trinta, quarenta, sessenta pares de brincos. Vão comprando e acumulando ao longo da vida, vão ganhando. Não conseguem passar por uma bijuteria ou joalheria sem provar diante do espelho um pequeno penduricalho nas orelhas. E compram, não resistem a três provadas.

Carros! Você precisa de mais do que um carro? Há pessoas que têm três, quatro. Como se houvesse grande diferença entre usar um e outro como condução. Para viajar, sim, o tipo faz diferença, e nesse caso poderiam comprar um para as duas funções. Preferem ostentar.

Imelda Marcos gostava de sapatos, tinha 3 000, comprados com o suor do povo filipino. Já vi foto de uma perua brasileira exibindo sua coleção de mais de duas centenas de calçados. E trinta bolsas de grife. De quantas bolsas você precisa?

É comum o consumista não conseguir escolher entre uma coisa e outra – porque escolher uma seria perder a outra – e para pôr fim à angústia leva as duas. Na infância dos consumistas faltaram ou falharam a orientação na compra e o apoio à decisão tomada. Frustrações da infância pedem compensações quando o dinheiro permite. Mas há consumistas pobres, que compram quinquilharias baratas e desnecessárias na Rua 25 de Março, enquanto as poderosas compram supérfluos caríssimos na Daslu.

Coleções não são a mesma coisa. Você coleciona bolinhas de gude, palitos de picolé, caixas de fósforos, lápis, figurinhas, rodelas de chope, rolhas, enfim, coisas que não valem nada, e coleciona coisas que chegam a valer muito, como selos. Não têm utilização prática. É diferente do consumo, de acumular bens de uso porque não consegue se controlar.

É diferente também de juntar raridades. Um apresentador de televisão tinha dezenas de relógios de pulso raros, antigos. É diferente, dizia, de ter um monte de relógios mais caros do que raros, de fabricação e uso atuais. De quantos relógios você precisa?

domingo, 16 de junho de 2013

Serendipitia

Há um antigo conto de fadas que se passa no Sri Lanka (antigo Ceilão) – quando este ainda se chamava Serendipe – uma história que fala sobre uma princesa que tinha três pretendentes ao casamento e como não estava muito disposta a se casar, passou a cada um deles uma tarefa impossível de ser realizada, se comprometendo com aquele que conseguisse cumprir a tarefa. No final, os três fracassaram e ela obteve sucesso em sua estratégia, porém, todos os pretendentes, no decorrer de seus esforços, acabaram fazendo descobertas inesperadas e afortunadas, fortuitamente.
 Surgiu daí o termo “serendipitia” que significa: descobrir coisas úteis, por acaso; encontrar aplicações de forma imprevista.
A vida nos reserva toda uma infinidade de “serendipitias”, porque nos coloca em determinadas situações em busca de certos objetivos e por fim, atingindo ou não a intenção inicial, acabamos nos defrontando com novos aprendizados, experiências e vivências, muitas vezes mais importantes e decisivas que o primeiro objetivo. Porém, para que isso ocorra, é preciso que nossa percepção esteja aberta. Que nosso ser seja capaz de perceber a riqueza dos objetivos secundários (imprevistos). Que o foco excessivo no objetivo inicial não seja ofuscante a ponto de impedir nossa evolução no rico contexto em que estamos inseridos.
Os sutis sinais que surgem, muitas vezes nos passam desapercebidos, pois estamos tão centrados em algo que perdemos a oportunidades de sentir, perceber e avaliar a riqueza do contexto à nossa volta. À medida que amadurecemos, tendemos a nos tornar mais sensíveis, atentos e perceptivos aos sinais, mas isso não está necessariamente ligado à idade, mas sim ao amadurecimento. Daí a relação com a complexidade da vida.
Dar oportunidade para o inesperado tem sido algo que por vezes tem me trazido gratas surpresas em minha atuação como professor. Devido a algo inesperado, acabo percebendo que meu plano de aula perdeu efetividade e me vejo obrigado a improvisar. Nem sempre dá certo, mas quando dá, é porque aparece algo – seja um aluno, um assunto ou uma situação – que dá início ao improviso e a riqueza e envolvimento dos envolvidos trazem muito mais resultado do que a aula planejada inicialmente, mesmo que tudo se direcione para um caminho ou conteúdo não previsto.

Fonte: Wikipedia
 

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Para Viver Um Grande Amor- Vinicius de Moraes

Para viver um grande amor, preciso é muita concentração e muito siso, muita seriedade e pouco riso — para viver um grande amor.

Para viver um grande amor, mister é ser um homem de uma só mulher; pois ser de muitas, poxa! é de colher... — não tem nenhum valor.

Para viver um grande amor, primeiro é preciso sagrar-se cavalheiro e ser de sua dama por inteiro — seja lá como for. Há que fazer do corpo uma morada onde clausure-se a mulher amada e postar-se de fora com uma espada — para viver um grande amor.

Para viver um grande amor, vos digo, é preciso atenção como o "velho amigo", que porque é só vos quer sempre consigo para iludir o grande amor. É preciso muitíssimo cuidado com quem quer que não esteja apaixonado, pois quem não está, está sempre preparado pra chatear o grande amor.

Para viver um amor, na realidade, há que compenetrar-se da verdade de que não existe amor sem fidelidade — para viver um grande amor. Pois quem trai seu amor por vanidade é um desconhecedor da liberdade, dessa imensa, indizível liberdade que traz um só amor.

Para viver um grande amor, il faut além de fiel, ser bem conhecedor de arte culinária e de judô — para viver um grande amor.

Para viver um grande amor perfeito, não basta ser apenas bom sujeito; é preciso também ter muito peito — peito de remador. É preciso olhar sempre a bem-amada como a sua primeira namorada e sua viúva também, amortalhada no seu finado amor.

É muito necessário ter em vista um crédito de rosas no florista — muito mais, muito mais que na modista! — para aprazer ao grande amor. Pois do que o grande amor quer saber mesmo, é de amor, é de amor, de amor a esmo; depois, um tutuzinho com torresmo conta ponto a favor...

Conta ponto saber fazer coisinhas: ovos mexidos, camarões, sopinhas, molhos, strogonoffs — comidinhas para depois do amor. E o que há de melhor que ir pra cozinha e preparar com amor uma galinha com uma rica e gostosa farofinha, para o seu grande amor?

Para viver um grande amor é muito, muito importante viver sempre junto e até ser, se possível, um só defunto — pra não morrer de dor. É preciso um cuidado permanente não só com o corpo mas também com a mente, pois qualquer "baixo" seu, a amada sente — e esfria um pouco o amor. Há que ser bem cortês sem cortesia; doce e conciliador sem covardia; saber ganhar dinheiro com poesia — para viver um grande amor.

É preciso saber tomar uísque (com o mau bebedor nunca se arrisque!) e ser impermeável ao diz-que-diz-que — que não quer nada com o amor.

Mas tudo isso não adianta nada, se nesta selva oscura e desvairada não se souber achar a bem-amada — para viver um grande amor.


Texto extraído do livro "Para Viver Um Grande Amor", José Olympio Editora - Rio de Janeiro, 1984, pág. 130.
           

domingo, 2 de junho de 2013

Por uma escola leitora

CLUBE DA LEITURA EMEF PROFESSORA MARILI DIAS
A leitura é um assunto sério, de toda a escola e comunidade. E, por mais que o senso comum afirme que a juventude não goste de ler, sabemos que isso não é verdade! O que nossos jovens não gostam é de não ter a chance de escolher aquilo que querem ler. Crescer e viver no século XXI significa interagir com o texto escrito em diversos suportes, do tradicional papel até os meios digitais. O objetivo da sala de leitura nesse contexto é ampliar e qualificar as oportunidades de leitura dos jovens, estando atenta ao imenso potencial de convívio e de troca de experiências que move a juventude para aprender.

Assim, a sala de leitura é um espaço privilegiado e singular na escola: ela pode influenciar decisivamente a maneira como a comunidade escolar , sente, pensa, decide e age em relação à leitura/juventude. É de responsabilidade da sala de leitura promover o acesso e ampliação da leitura, o aprimoramento dos estudos e o desenvolvimento de atividades que fortaleçam o convívio dos alunos com leitores, histórias, livros e outros suportes textuais.

O convite é que a sua escola se torne uma escola leitora, centrada no aluno, cujo centro irradiador seja a sala de leitura! Isso quer dizer que as ações propostas devem romper com as paredes da sala de leitura e se estender para todos os espaços da escola.

 

FONTE: Instituto Ayrton Senna 2011-superAÇÃO – Projeto Sala de Leitura

sábado, 25 de maio de 2013

EU ETIQUETA -Carlos Drummond de Andrade

Em minha calça está grudado um nome
  Um nome... estranho.

 Meu blusão traz lembrete de bebida
Que jamais pus na boca, nessa vida,
Em minha camiseta, a marca de cigarro
Que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produtos
Que nunca experimentei
Mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
De alguma coisa não provada
Por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
Minha gravata e cinto e escova e pente,
Meu copo, minha xícara,
Minha toalha de banho e sabonete,
Meu isso, meu aquilo.
Desde a cabeça ao bico dos sapatos,
São mensagens,
Letras falantes,
Gritos visuais,
Ordens de uso, abuso, reincidências.
Costume, hábito, permência,
Indispensabilidade,
E fazem de mim homem-anúncio itinerante,
Escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.

 É duro andar na moda, ainda que a moda
Seja negar minha identidade,
Trocá-la por mil, açambarcando
Todas as marcas registradas,
Todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
Eu que antes era e me sabia
Tão diverso de outros, tão mim mesmo,
Ser pensante sentinte e solitário
Com outros seres diversos e conscientes
De sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio
Ora vulgar ora bizarro.
Em língua nacional ou em qualquer língua
(Qualquer principalmente.)
E nisto me comparo, tiro glória
De minha anulação.
Não sou - vê lá - anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
Para anunciar, para vender
Em bares festas praias pérgulas piscinas,
E bem à vista exibo esta etiqueta
Global no corpo que desiste
De ser veste e sandália de uma essência
Tão viva, independente,
Que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
Meu gosto e capacidade de escolher,
Minhas idiossincrasias tão pessoais,

 Tão minhas que no rosto se espelhavam
E cada gesto, cada olhar
Cada vinco da roupa
Sou gravado de forma universal,
Saio da estamparia, não de casa,
Da vitrine me tiram, recolocam,
Objeto pulsante mas objeto
Que se oferece como signo dos outros
Objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
De ser não eu, mas artigo industrial,
Peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome novo é Coisa.
Eu sou a Coisa, coisamente.

Que não é meu de batismo ou de cartório



 

FONTE:http://educador.brasilescola.com/estrategias-ensino/o-consumismo-na-voz-carlos-drummond-andrade.htm

segunda-feira, 20 de maio de 2013

QUADRILHA by Dalinha Catunda

Arte com papel - Professora Suse Mendes
 Maria bonita
vestida de chita
dançava São João.
Em meio a quadrilha,
seguia a trilha
do seu coração.
Coração aventureiro
gostava de Pedro,
e queria João.
João tava difícil,
não foi sacrifício
pegar noutra mão
Viva S. Pedro!
Viva S. João!
Maria era bonita!
E com laço de fita
virou perdição.
Com cabelos trançados,
e seu requebrado,
chamava atenção.
Dançando faceira
esqueceu-se de Pedro,
e também de João.
Nos braços de Antônio
perdeu-se nos sonhos,
ardeu-se em paixão.
Foi aí que Maria
perdeu sua fita
rolando no chão.
Maria aflita
sem laço de fita
engrossou a cintura
e fugiu do sertão