sábado, 5 de outubro de 2013

A FADA DA LUZ - (Meyr Vasconcelos)


Um pouco antes de chegar em casa, Carlinhos percebeu que havia algo estranho no ar, o ar parecia carregado de energia negativa.
Abriu a porta com cuidado e entrou. Logo percebeu o motivo. Seus pais o esperavam sentado no sofá com cara de poucos amigos. Mal entrou, seu pai já começou a falar:
– Muito bem! Parece que você nos deve uma explicação, rapazinho! Sua professora nos chamou até a escola para falar do seu desinteresse pelos estudos. Poderia nos explicar o porquê do
seu desinteresse?
Carlinhos sentou-se junto deles e resolveu ser o mais sincero possível.
– Eu não sei, pai: apenas não consigo mais gostar de estudar,
tento prestar atenção, mas a aula sempre parece chata, por mais que eu me esforce, não consigo aprender.
Sua mãe triste comentou com voz de choro:
– Como pode, filho? Você sempre foi um excelente aluno, o melhor da sala e, de repente, você fica assim, desinteressado pelos estudos! Deve haver uma explicação.
– Mãe, simplesmente não sei o que se passa comigo, tento me interessar, me esforço pra lembrar as tarefas que a pede pra fazer em casa, mas, quando me lembro, já é tarde demais e acabo não fazendo. Prometo que vou me esforçar.
Subiu para seu quarto triste e cabisbaixo. Na verdade, não se interessava pela escola e não entendia o porquê. Depois de pensar muito, resolveu descer e jantar. Todos fizeram a refeição em silêncio.
Seu pai foi para a sala assistir ao jornal, enquanto sua mãe foi lavar a louça do jantar.
Carlinhos foi até a praça, sentou-se num banco e ficou observando um grupo de crianças que brincavam de roda, felizes e despreocupadas. Como eram felizes! Ainda não estavam na idade de ir para a escola. Ainda bem, pensou. Tomara que, quando chegar o dia de essas crianças frequentarem a escola, não passem pelo mesmo problema.
Carlinhos sempre gostou tanto de estudar e estava numa situação tão difícil e sem explicação. Voltou para casa e, ao se deitar, viu através da janela aberta uma estrela cadente e fez um pedido.
– Estrela cadente, desejo do fundo do meu coração voltar a ser um garoto estudioso. Pediu com muita fé e depois adormeceu.
De madrugada, acordou com uma voz doce e meiga. Abriu os olhos e viu uma pequena fada que iluminava o quarto todo com sua luz. Carlinhos pensou que talvez estivesse sonhando e, mesmo
assim, perguntou:
– Quem é você? O que faz aqui?
– Meu nome é Fada da Luz e vim para atender ao seu pedido.
Carlinhos ficou muito feliz.
– Que bom! O que você fará?
– Bom, durante cinco dias consecutivos lhe farei perguntas diferentes para as quais esperarei respostas à noite. A primeira pergunta é esta: quem foi Albert Einstein?
– Sei lá! – respondeu Carlinhos.
– Não precisa responder agora, amanhã à noite voltarei para saber a resposta.
Após falar isso, desapareceu. Carlinhos levantou bem cedinho, seus pais já tinha ido
trabalhar. Olhou nos livros da estante da sala e não encontrou nada sobre Albert Einstein. Foi para a escola e, quando lá chegou, foi logo perguntando para o seu professor de Ciências que lhe
respondeu:
– Este gênio do século XX teve uma infância solitária. Gostava de ler e ouvir música, não se identificando com as brincadeiras praticadas pelas outras crianças. Einstein sempre demonstrou grande
habilidade para a compreensão dos conceitos matemáticos. Com 12 anos, aprendeu sozinho geometria euclidiana e, quando se mudou para Milão, em 1894, Einstein fez a leitura de inúmeros livros de
Ciências. Einstein sempre foi crítico dos métodos de ensino das escolas e, apesar de ter fraco resultado escolar, Einstein tinha uma enorme curiosidade em compreender o Universo. Apresentou uma
postura autodidata, afirmando que “preferiria suportar qualquer coisa ou castigo a ter que papaguear as coisas aprendidas, e autoclassificava-se como “livre-pensador fanático”. Por que quer
saber, Carlinhos?
– Por nada, professor; era só curiosidade.
Na madrugada, a fada chegou e perguntou-lhe a resposta.
Carlinhos respondeu com perfeição e entusiasmo.
– Muito bem, agora vamos à próxima pergunta: quem foi Rui Barbosa? Voltarei amanhã novamente.
E desapareceu como da outra vez.
No dia seguinte, Carlinhos encontrou a resposta no livro de escola e descobriu que Rui Barbosa era dotado de uma memória
privilegiada, acrescida de uma curiosidade intelectual insaciável, seus hábitos da leitura e da escrita foram se incorporando à sua vida de tal maneira que mesmo as horas de lazer eram dedicadas aos livros;
anotava e assinalava verbetes e assuntos, fixava ideias e frases, elaborava bibliografias, tudo que lhe interessasse e de que um dia viesse a precisar. Esse hábito, ele o desenvolveu ao longo da vida;
ajudou a exercitar sua memória e duplicou sua capacidade de trabalho. Quanto mais lia, mais impressionado ficava e, à noite, quando a fada apareceu, Carlinhos a esperava acordado e lhe mostrava o resultado da pesquisa. Muito contente, recebeu os parabéns da fada. A próxima pergunta foi sobre Machado de Assis. Pulou cedo no dia seguinte e, depois da aula, voltou até a biblioteca, onde obteve rapidamente a resposta desejada. Descobriu que Joaquim Maria Machado de Assis era um descendente de
escravos, seu pai trabalhava como pintor de paredes e a mãe, portuguesa, morreu quando ele tinha dez anos. Descobriu também que ele não teve educação formal, pois teve que começar trabalhar cedo para ajudar a família. Aprendeu a falar francês com um padeiro, já alemão e inglês aprendeu estudando sozinho. Achou engraçado, porque, assim como ele, o escritor também tinha uma caligrafia ruim que, às vezes, até ele tinha dificuldade de entender o que escrevia. Ficou perplexo ao saber que Machado de Assis era gago e tinha epilepsia. Como das outras vezes, à noite a fada ouviu sobre a pesquisa. E fez a última pergunta:
– Quem foi Carlos Drummond de Andrade?
De manhã, Carlinhos foi até a biblioteca municipal e, depois de algum tempo, encontrou a resposta. Ficou surpreso ao descobrir que este grande escritor, aos 17 anos, tinha sido expulso do Colégio
Anchieta, em Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, depois de um desentendimento com o professor de Português. Tinha a mania de picotar papel e tecidos.
Carlinhos aproveitou para pegar emprestados alguns livros na biblioteca, coisa que não fazia há muito tempo. À noite, a fada voltou e, depois de ouvir Carlinhos falar sobre Carlos Drummond de Andrade com entusiasmo que não se via há tempos, despediu-se.
Antes, porém, Carlinhos perguntou-lhe:
– Nossa, como você conseguiu fazer com que eu me interessasse pelos estudos novamente?
– Através destas pesquisas, você deve ter observado que todos tinham algo em comum, a determinação para ter sucesso, revelando acima de tudo sentimentos de medo, depressão e solidão, desinteresse pelas coisas ensinadas de forma comum, mas, e apesar disso, superaram suas dificuldades e conquistaram o mundo! Você só precisava de incentivo. O conhecimento é o pão que alimenta nosso espírito. Estude bastante, dedique-se e será feliz!
Graças à Fada da Luz, Carlinhos estudou muito e se tornou um mestre da Língua Portuguesa. E resolveu escrever um livro sobre um menino que conheceu uma linda fada que iluminou a sua vida.


Meir Almeida Alves Machado nasceu em Ipuã, cidade do interior de São Paulo, no dia 31 de agosto de 1966. Aos 45 anos de idade, publicou seu primeiro livro As aventuras de Samuca e sua turma, pela Biblioteca 24 horas, realizando seu sonho de infância.

Um comentário:

Unknown disse...

adorei,nao é pq foi minha mae quem escreveu nao mas...ficou ótimo!