Poema de sete faces
Quando nasci, um anjo torto desses que vivem na sombra disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida. As casas espiam os homens que correm atrás de mulheres. A tarde talvez fosse azul, não houvesse tantos desejos. O bonde passa cheio de pernas: pernas brancas pretas amarelas. Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração. Porém meus olhos não perguntam nada. O homem atrás do bigode é sério, simples e forte. Quase não conversa. Tem poucos, raros amigos o homem atrás dos óculos e do -bigode, Meu Deus, por que me abandonaste se sabias que eu não era Deus se sabias que eu era fraco. Mundo mundo vasto mundo, se eu me chamasse Raimundo seria uma rima, não seria uma solução. Mundo mundo vasto mundo, mais vasto é meu coração. Eu não devia te dizer mas essa lua mas esse conhaque botam a gente comovido como o diabo.
De Alguma poesia
(1930)
|
Carlos Drummond de Andrade ,
nascido em 31 de outubro de 1902, em Minas Gerais, numa cidade chamada Itabira,
a qual permeou parte de sua obra. Herdou do Modernismo a liberdade linguística,
o verso livre, o metro livre e as temáticas cotidianas. Affonso Romano de Sant'ana costuma
estabelecer a poesia de Carlos Drummond a partir da dialética "eu x
mundo", desdobrando-se em três atitudes:
Eu maior que o mundo —
marcada pela poesia irônica
Eu menor que o mundo —
marcada pela poesia social
Eu igual ao mundo — abrange
a poesia metafísica
Nenhum comentário:
Postar um comentário